segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Multiculturalismo de Estado




DISCURSO NA CONFERÊNCIA DE MUNIQUE
DAVID CAMERON DENUNCIA FRACASSO DO MULTICULTURALISMO


Cameron defendeu que é preciso uma identidade nacional mais forte e uma política de “liberalismo musculado” para reforçar os valores da igualdade e da lei junto de todos os elementos da sociedade. O tema da integração está no centro das preocupações no Reino Unido desde o atentado que fez 56 mortos nos transportes públicos de Londres em Julho de 2005, mas o líder dos conservadores ainda não tinha feito nenhum grande discurso sobre o tema desde que chegou à chefia do Governo, em Maio do ano passado.

Na Conferência de Munique sobre segurança, Cameron criticou o que chama “multiculturalismo de Estado”, sustentando que organizações que pouco fazem para combater o extremismo devem deixar de receber dinheiros públicos. “Vamos avaliar correctamente estas organizações: Acreditam nos direitos universais – incluindo para as mulheres e membros de outras crenças? Acreditam na igualdade perante a lei? Acreditam na democracia e no direito do povo a eleger o seu governo? Encorajam a integração ou o separatismo?”, questionou.


Público 05.02.2011

«Os cidadãos com diversas identidades podem ser representados como iguais se as instituições públicas não reconhecerem as identidades de cada um, mas somente os nossos interesses mais comuns relativos à liberdades civil e política, rendimentos, cuidados de saúde e educação? Além de garantirem a todos os mesmos direitos, o que é que o respeito igualitário pelas pessoas implica? Até que ponto é que as nossas identidades como homens e mulheres, americanos de ascendência africana ou asiática, ou americanos nativos, cristãos, judeus ou muçulmanos, canadianos franceses ou ingleses têm?»

Amy Gutmann

Até agora o denominado “multiculturalismo de Estado”, estribado numa perspectiva universalista das democracias liberais, respondia que o respeito igualitário pelas pessoas implica o respeito pela diversidade, e que “ao advogar a diversidade, a democracia liberal está adoptar, não uma perspectiva particularista, mas sim universalista”. Mas as coisas estão a mudar e as políticas de reconhecimento e integração, advogadas politicamente viva voce, foram substituídas por políticas da indiferença, ciciadas sotto voce, no começo, proclamadas conciliarmente pelas figuras gradas da política europeia, por fim.
No comentário sobre o texto Políticas do Reconhecimento de Charles Taylor, o filósofo Michael Walzer tipifica duas perspectivas universalistas que “orientam as democracias liberais em diferentes direcções políticas” no que concerne ao problema do multiculturalismo: a primeira, sustenta a neutralidade e indiferença política do Estado em relação às diversas, e muitas vezes conflituosas, concepções de uma vida boa existentes na sociedade pluralista (e que pode ser uma indiferença liberal "musculada"); a segunda, crismada como “multicuralismo de estado”, promove políticas de reconhecimento e integração sob três condições: a) protecção dos direitos fundamentais de todos os cidadãos; b) inexistência de manipulação e coacção na aceitação de valores culturais; c) responsabilização de pessoas e instituições que fazem opções culturais minoritárias.
Qual a perspectiva mais democrática? Qual a menos democrática? Alguns,cínica e prudencialmente, dirão (Cameron incluído) que a mais democrática é a que mais faz perigar a democracia; outros invocarão o perigo maior da inexistência de "politics of recognition" e citarão Rousseau.
Apesar das aporias filosóficas, os grandes desafios ao multiculturalismo não são somente filosóficos, mas também políticos. Uma boa parte das críticas de Cameron ao multiculturalismo radica na compreensível ansiedade identitária e securitária em relação ao estrangeiro e na nostalgia de um passado no qual todos partilhavam laços de identidade e de solidariedade. Um passado irrestaurável? Naturalmente.

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