segunda-feira, 26 de dezembro de 2011
O Homem Visível
Num artigo publicado na Harper`s, The Visible Man – Ethics in a world without secrets, o filósofo Peter Singer inicia a reflexão ética sobre as consequências globais da Internet relembrando o panóptico de Bentham. Um edifício em forma de anel, no meio do qual havia um pátio com uma torre no centro. O anel divide-se em inúmeras celas, perfeitamente visíveis a partir da torre de vigia que, pan-opticamente, garante a absoluta visibilidade e transparência de quem se encontra no seu interior. Assim edificado, di-lo Foucault, o Panóptico permite aperfeiçoar o exercício do poder de diferentes formas: pode reduzir o número dos que o exercem, ao mesmo tempo que multiplica o número daqueles sobre os quais é exercido; exerce-se sem intervir, espontaneamente e sem ruído; vigia todas as dependências onde se quer manter o domínio e o controle; o controle é exercido mesmo quando não há realmente quem assista do outro lado. Augurava Bentham que tal arquitectura, aplicada às escolas, fábricas, presídios, hospitais e asilos criaria “a new scene of things”, reformando a moral, preservando a saúde, difundindo a instrução e promovendo o bem público. Perfeição do poder, segundo Foulcaut, absolutizado pela invisibilidade de um - movido pelo princípio da inspecção - e pela visibilidade de todos - desapossados pelo princípio da exposição - , a arquitectura anelar do Panóptico é, contudo, inadequada para figurar a complexidade reticular das relações de poder da Internet.
O novo panóptico de Singer, o da era da Internet, preserva e supera em larga escala o princípio da inspecção e da exposição. Por um lado, o novo panopticismo da net e das novas tecnologias da informação, herdeiro ainda de Bentham, permite a recolecção ilimitada de informação individual pelos diferentes poderes, que pode funcionar como uma forma de desapossamento e privação (liberdade, reserva da vida privada). Por outro lado, a submissão intencional e voluntária a um campo de visibilidade constitui uma novidade, porque, citando Singer, we blog, we tweet, and post what we are doing, thinking, and feeling (…) we allow friends and contacts and even strangers, to know where we are at any time (…) we sign away our privacy in exchange for the conveniences of modern living, giving corporations access to information about our financial circumstances and our spending habits, which will then be used to target us for ads or to analyze our consumer habits. Por outro lado ainda, e perseguido uma ideia de transparência patente, por exemplo, na Wikileaks de Julian Assange, a Internet deu visibilidade às construções invisíveis do poder, aplicando-lhe reversamente o princípio de inspecção. Pergunta Singer: será a universalização do princípio da inspecção - perfeição do poder do Panóptico, segundo Foulcaut - a perfeição da democracia?
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