A propósito da
bizantina e católica questão de saber se, aquando da natividade, havia ou não
gado vacum e asinino no presépio, foram já arredadas todas as dúvidas: não havia. Podem
embezerrar alguns, asneirar outros, mas não senhor, não havia, e di-lo ex cathedra quem é infalível, o Papa, em
livro recente sobre Jesus Cristo. Sobre esta ninhice hermenêutica das Escrituras
estamos conversados, mas Bento XVI não se queda por aqui: não só o burro e a
vaca não estavam no presépio como a virgindade da mãe de Jesus Cristo é uma verdade inequívoca da fé. Ora, hoc opus, hic labor est ou, em tradução
libertária da minha avó Maria, aqui é que a
porca torce o rabo. E torce porquê? Porque se sobre as alimárias é fácil
encontrar a corroboração testamentária, sobre a virgindade de Maria a coisa pia
mais fino. Há uma disputação linguística perene sobre as palavras que o
hebraico e o grego usaram para se referirem à mãe do Messias. Recentemente, o
teólogo José Tolentino de Mendonça, a propósito de um livro cometido por José
Rodrigues dos Santos, veio reafirmar o que já era consabido: nas profecias de Isaías escritas em hebraico
a palavra que este usou para se referir à mãe do Messias foi “mulher jovem”,
almah, e não virgem. Na tradução para grego, o autor enganou-se neste versículo
e em vez de “mulher jovem” a palavra que usou foi parthénos, ou seja,” virgem”.
O problema é que o lapsus calami do
autor induz mil interpretações, que fazem deste engano uma interminável disputa
exegético-teológica. É claro que Nietzsche, mofino, resolveria o assunto de
outro modo e perguntaria: mas quem é que
mandou o autor, deus, usar uma língua que não aprendeu bem?
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