Num texto luminoso, o
filósofo Michael Sandel demonstra, a bem dizer more geometrico, como um fosso demasiado grande entre ricos e
pobres, para além de suscitar questões atinentes à justiça e à ética, prejudica
uma política do comum e a solidariedade que uma cidadania democrática exige. De
que modo? Escreve Sandel que, à medida
que a desigualdade se intensifica, os ricos e os pobres vivem vidas cada vez
mais separados. Os ricos mandam os
filhos para as escolas particulares (ou para escolas públicas dos subúrbios
ricos), deixando as escolas públicas urbanas para os filhos de famílias que não
têm outra alternativa. Para além disso, insiste o filósofo americano, uma tendência
semelhante conduz ao afastamento dos privilegiados de outras instituições e serviços
estatais - os ginásios privados
substituem os centros recreativos municipais e as piscinas, os condomínios com
segurança privada dependem menos da protecção policial pública, um segundo ou
terceiro carro elimina a necessidade de depender de transportes públicos –,
levando-os ao abandono de locais e serviços públicos, deixando-os para quem não
tem dinheiro para mais. As consequências são, segundo Michael Sandel, a nível
fiscal e a nível cívico. Em primeiro, os serviços públicos
degradam-se, já que os que não os utilizam têm cada vez menos vontade de os
financiar através dos seus impostos. Em segundo, os lugares públicos de
interacção (escolas, hospitais, instituições públicas) onde os cidadãos de
diferentes estratos sociais se juntavam e eram
escolas informais de virtude cívica tornam-se cada vez mais raros,
rarefazendo-se também a solidariedade e a
cidadania democrática. E demonstra-se assim quod erat demonstrandum.
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