O dever da felicidade
nas sociedades actuais, escreveu-o Pascal Bruckner, cumplicia com o dever de
bem-aventurança na saúde e com o seu martirológico, a via crucis dos ginásios, das dietas, da provação da privação. Vigiar
o corpo insurrecto, lugar de ameaça latente, da doença, do prazer vicioso, do
excesso de peso, do insidioso colesterol, tornou-se a obsessão da ideologia da
longevidade e da juventude que, di-lo Bruckner, é a ideologia das nações envelhecidas e dá do Ocidente a imagem de um
serviço de geriatria. Durante séculos tentaram, debalde, salvar-nos a alma.
Recusámos. Em boa verdade, não havia nada para salvar. Hoje, depois de um olhar
clínico corredio ter deslizado pelo inculpante hemograma, querem resgatar-me o
corpo malsão e santificá-lo por uma saúde longeva; querem o são corpo glorioso
ressurrecto, do açúcar, do sedentarismo, do colesterol. Mas continua a não
haver nada para salvar – a saúde é um
estado transitório que não augura nada de bom e o seu maior proveito é o silêncio
dos órgãos, isto é, o descaso negligente de si mesma.
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