quarta-feira, 7 de outubro de 2015

Mas há um texto de Claudio Magris que nos fala da “irredimível dor dos animais, povo obscuro que acompanha a nossa existência”, e da “treva que se acumula em nós com a morte dos seres vivos de que nos nutrimos”. A prosa de Magris fulge com a evidência da estrada de Damasco paulina e ficamos momentaneamente cegos. Depois, depois vemos melhor.

De Singer, do Animal Liberation, até ao The Case For Animal Rights, de Tom Regan, passando por nomes como Gary Francione e Bernard Rollin, confirma-se a existência de uma ensaística filosófica pletórica sobre os direitos dos animais. Das críticas ao especismo e antropocentrismo, ao reconhecimento da senciência animal, passando pela aplicação aos direitos dos animais de tradições éticas reconhecíveis, há um argumentário estuante que, malgrado o activismo de associações de defesa de animais, e até de partidos políticos, permanece recluso na cidadela académica. Leio-o, releio-o, e olho para o amor solícito e incondicional das minhas sobrinhas, que transforma a casa dos avós em refúgio terminal de todos os párias não humanos. Se acaso não gostassem de animais, se acaso os maltratassem, nenhum dos sobreditos argumentos teria a força suasória para a indiferença se transmudar no seu cuidado e desvelo. Mas há um texto de Claudio Magris que nos fala da “irredimível dor dos animais, povo obscuro que acompanha a nossa existência”, e da “treva que se acumula em nós com a morte dos seres vivos de que nos nutrimos”. A prosa de Magris fulge com a evidência da estrada de Damasco paulina e ficamos momentaneamente cegos. Depois, depois vemos melhor.

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