terça-feira, 22 de dezembro de 2015

Dicionário Do Mofino 37/ A extensão das actas escolares ameaça sobrepujar os nobiliários, os cronicões do Mosteiro de Santa Cruz de Coimbra e os romances de Jonathan Franzen empilhados. Por isso, e para que se comecem a publicar tais cartapácios em edições críticas, revistas e anotadas, aqui lavro de novo esta pequena definição que, depois de lida e aprovada, será votada ao olvido pela retentiva...

A extensão das actas escolares ameaça sobrepujar os nobiliários, os cronicões do Mosteiro de Santa Cruz de Coimbra e os romances de Jonathan Franzen empilhados. Por isso, e para que se comecem a publicar tais cartapácios em edições críticas, revistas e anotadas, aqui lavro de novo esta pequena definição que, depois de lida e aprovada, será votada ao olvido pela retentiva .


Acta, s.f. registo escrito da logorreia ociosa de congressos e reuniões; na escola, o único género literário conhecido e cultivado, com os consabidos recursos retóricos, as minudências especiosas, a sintaxe soporífera. O género é cultivado sempre que haja um ajuntamento de pelo menos dois professores, embora tenha havido notícia de solilóquios vertidos em acta; a pergunta “quem faz a acta?” costuma gerar um esquema responsivo behaviorista E-R, que se manifesta em reflexos catatónicos amplamente descritos pela literatura: fixação evasiva na tampa da caneta; olhar hagiográfico suspenso num ponto de fuga; ensimesmamento proprioceptivo nos ruídos digestivos e nas luras dos queixais; contrariamente ao que se diz, uma acta não deve ser um relato verdadeiro, mas sim um relato verosímil, isto é, semelhante à verdade. Não se preocupem pois com as pequenas imprecisões e omissões. Poucos se lembrarão do que se passou integralmente e, destes poucos, pouquíssimos quererão ver a acta refeita e relida – acta ne agamus (não cuidemos do que está feito).

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