quinta-feira, 23 de maio de 2013

Diário dos Perplexos/Self Made Boy



No L'Euphorie Perpetuelle - Essai Sur Le Devoir De Bonheur, escreveu Pascal Bruckner:
Uma das perversidades do desemprego é talvez ter emprestado ao trabalho, mesmo ao mais estupidificante, uma aura que já tinha perdido durante os anos de prosperidade. Obcecadas pelo pleno emprego, as nossas sociedades pretendem ocupar as pessoas a todo o custo e celebram a escravatura salarial sem se interrogarem sobre a qualidade dessa ocupação. Ao ponto de a sobrecarga de trabalho se ter tornado um sinal ostentatório de potência; e ainda que as classes laboriosas aspirem à ociosidade, as classes ditas ociosas tornam-se laboriosas, fixando-se para si próprias semanas de 60 a 80 horas e exibindo o excesso de trabalho como índice da sua superioridade.
Não admira, pois, que esta aura do trabalho - ainda que muito perto da escravidão e longíssimo do trabalho como construção de si e do mundo, de Aristóteles, Marx ou Arendt - ofusque os mais lúcidos. O que temos perante nós, diria Arendt, é o pior que podemos imaginar: a perspectiva de uma sociedade de trabalhadores sem trabalho, isto é, de trabalhadores privados da única actividade que lhes resta. Isto explicará que um símplice remoque de um self made boy sobre o ordenado mínimo e o desemprego tenha tido tanta ventura retórica.

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