quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

Oração pela privatização dos CTT (Pace, Saramago!)

Marx afirmou que a propriedade privada nos tornou tão estúpidos e limitados, que um objecto só é nosso quando o possuímos, o que o terá levado a partilhar fraternalmente a fortuna de Engels. Proudhon, frasista compulsivo, proclamou que a propriedade é um roubo, depois de ter plagiado a proclamação. Já para os catecúmenos liberais – mesmo para aqueles que passinham os primeiros passos na passeadeira da alta política – as privatizações são um arroubo de redenção económica, e o friso dos economistas coristas, secretários de estado e ministros, apodíctico, assevera que é necessário retirar o Estado dos negócios. Mas, entre-dentes, o rapazio resmoneia: 
Ai os malandrins ronhosos! Ai que a política para eles é a continuação dos negócios por outros meios! Ai os manhosos, que sempre, em rapina, sobrepairaram sobre o público e o privado! Ai, tomai atenção, pois, à vidinha vindoura desta matulagem, já que um ministro não é senão um político em trânsito entre um conselho de administração e outro conselho de administração!
Para eles, os malandrins ronhosos, mais uma vez, a saramaguiana oração exprobatória.

Oração pelas Privatizações

«Privatize-se tudo, privatize-se o mar e o céu, privatize-se a água e o ar, privatize-se a justiça e a lei, privatize-se a nuvem que passa, privatize-se o sonho, sobretudo se for diurno e de olhos abertos. E finalmente, para florão e remate de tanto privatizar, privatizem-se os Estados, entregue-se por uma vez a exploração deles a empresas privadas, mediante concurso internacional. Aí se encontra a salvação do mundo… e, já agora, privatize-se também a puta que os pariu a todos.»

                                                                                                               José Saramago – Cadernos de Lanzarote - Diário 

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