Um relatório de uma ONG
chocou o mundo e Henrique Monteiro: as 85
pessoas mais ricas do planeta têm os mesmos recursos do que a metade mais pobre
da população mundial. Depois do estupor moral inicial, Henrique Monteiro
lembrou-se de algumas das pessoas mais ricas do mundo, Bill Gates e Warren
Buffett, do seu fervor caritativo e filantrópico, e discorre: se eles não existissem, não tivessem tido ideias e lances geniais,
então o mundo seria mais pobre, logo o mal não está em haver ricos, mas em
haver pobres, logo a igualdade que se exige nas sociedades é a de
oportunidades, de direitos e de dignidade, não a de recursos ou riqueza. O
argumento de Henrique Monteiro tem a desenvoltura símplice e temerária de uma reductio ad absurdum - a falácia que mas
excita a lógica funicular de um doido -, como se fosse crível que sem um módico
de partição justa da riqueza e de recursos houvesse um minimum de igualdade de oportunidades, de direitos e dignidade, mas
o mais importante do texto de Henrique Monteiro é o subtexto que nele, à
sorrelfa, perpassa: a filantropia e a caridade, como o amor cristão, a cobrir a
multidão dos pecados do capitalismo global e a substituir-se à justiça (não dês
por caridade o que é devido por justiça); a genialidade voluntariosa e
industriosa dos ricos, contraposta à presuntiva autocomiseração fatídica dos
pobres; enfoque monológico na criação da riqueza, nem uma palavra para a lógica
da sua distribuição. O que impressiona no subtexto de Henrique
Monteiro sobre a pobreza e a riqueza, sempre naturalizadas e pensadas a partir
da visão microscópica do indivíduo, é não haver uma palavra, quer para os
complexos sociais e económicos que lhes subjazem, quer para a política como
forma de rever o presente e antecipar o futuro. A menos que, na sua lógica
férrea, não exista essa coisa chamada
sociedade.
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