Recentemente, o cineasta
e escritor Arnaldo Jabor, com a viveza jucunda do português do Brasil, dizia na
Globo que a suprema ironia da situação no Iraque é que os Estados Unidos terão
de se aliar ao Irão contra o terror sunita e que, vergonhosa e espantosamente,
Saddam no poder era melhor para o mundo. Sabíamos que a guerra é a god's way of teaching americans geography,
e agora somos todos concordes em lamentar que o altíssimo se tenha ficado só
pela Geografia.
segunda-feira, 30 de junho de 2014
domingo, 29 de junho de 2014
Diário dos Perplexos/O tempo kairológico do FMI
Na mitologia, o deus do
tempo oportuno, Kairós, filho de Chronos e de Tykhé, tem cabelos só na testa, de
modo que só pode ser agarrado estando de frente, não podendo ser apanhado de
novo ao dar as costas.
Falar e calar,
fazer e deixar fazer o que se deve no momento que se deve, carece da mestria
do tempo kairológico em que, di-lo François Jullien, o instante se torna de repente uma chance. Sabiam-no os sofistas na
oratória, sabe-o o ladrão na ocasião, o pecador na tentação, os técnicos do FMI na reestruturação.
sábado, 28 de junho de 2014
Diário dos Perplexos/Ora aí está a doçura da novilíngua orwelliana do Politics and the English Language: podem ganhar 400 euros, ser esbulhados dos direitos sociais históricos, dos direitos incessíveis ao derriço laboral e à reprodução, mas foda-se!...são colaboradores.
Um dia destes em
funeral de conhecido, deposto o esquife no coval pelos defunteiros à força de unha e cordame, coberto pá ante pá por um coveiro enérgico e vivaz, vira-se o
presidente da junta e cicia-me: este é um
dos melhores colaboradores da junta.
Ora aí está a doçura da
novilíngua orwelliana do Politics and the
English Language: podem ganhar 400 euros, ser esbulhados dos direitos
sociais históricos, dos direitos incessíveis ao derriço laboral e à reprodução, mas foda-se!...são
colaboradores.
quarta-feira, 18 de junho de 2014
Diário dos Perplexos/ Manual do Aplicador
Quando, há alguns anos
atrás, o Ministério da Educação publicou essa magnus opum sobre o comportamento
decente do docente /vigilante às provas de aferição do 9ºano, o Manual do
Aplicador, desde logo se soube que o pouco siso daria lugar ao riso e ao absurdo.
Quando, há alguns anos atrás, o furor regulamentador do ministério da educação
definiu, até ao ridículo e à ninhice, todo o processo de aplicação dos exames,
tratando os professores como imbecis, a derrisão já espreitava, escarninha,
mofenta. Esta gente não percebe que quando se quer ser obsessivamente minucioso
a minúcia nunca basta, e desatou a regulamentar o bom senso como se ele fosse a
coisa mais mal distribuída nos professores. E, nas reuniões preparatórias,
perguntou-se: a que velocidade deve andar na sala o professor vigilante para
não perturbar a quietação do momento? As escolas darão graciosamente umas
pantufinhas furta-passos? A garridice do vestuário é permitida? Não ofuscará a
inteligência do examinando? Os rótulos das garrafas de água devem ser
retirados? Não podem conter informação à sorrelfa?
O ministério diz que há
centenas de queixas: alunos que encasquetam o tictac dos professorais relógios
e desatinam; alunos perturbados pela garridice taful e tamanho de saias, blusas
e demais formosuras das professoras; alunos nevrosados pela chiante meia-sola;
alunos a quem petrifica o miolo pelo simples olhar do professor vigilante. Há
queixas que não lembram ao diabo, mas a minudente lógica ministerial a todas
provê, prevê, regulamenta e, finalmente,
a todos arregimenta para o seu zeloso cumprimento.
Agora que os exames se
preparam para ser a grande via crucis para a perfeição do sistema, as notícias
não são boas. Preparem-se, amigos professores! Ouve-se e teme-se. Ouve-se que o
ministério se prepara para reeditar, em edição revista e aumentada (dois volumes,
500 páginas), o Manual do Aplicador. Ouve-se que no índice remissivo só a
palavra fraude terá 232 a entradas. Temem-se longas sessões de laboriosa
exegese, milhentas horas de formação creditada, quiçá teses de mestrado e
doutoramento. Teme-se que o Manual seja uma espécie de Código de Hamurabi, a
Cabala. Teme-se, enfim, que não responda à presuntiva questão: e se, de
repente, um examinando lhe oferecer flores?
domingo, 15 de junho de 2014
Dicionário do Mofino 49/Futebol, s. m. Desporto jogado com os pés, mãos e cabeças perdidas...
Futebol,
s. m.
Desporto jogado com os pés, mãos e cabeças perdidas, por duas equipas de onze
jogadores, três árbitros e duas hordas. Invariavelmente, em paro, há uma bola a
assistir; o filósofo Jean-Paul Sartre reflectiu sobre a singularidade desse
objecto redondo em-si, que concita
tantas paixões, alvitrou que num jogo de futebol tudo fica complicado na
presença do adversário (o Outro, o Inferno), e acabou por concluir que numa
complicação tudo fica mais complicado na presença da filosofia; o poeta recifense
João Cabral de Melo Neto definiu assim a anima
da bola de futebol.
A bola não é inimiga
como o touro, numa corrida;
e embora seja um utensílio
caseiro e que não se usa sem risco,
não é o utensílio impessoal,
sempre manso, de gesto usual:
é um utensílio semivivo,
de reação própria como bicho,
e que, como bicho, é mister
(mais que bicho, como mulher)
usar com malícia e atenção
dando aos pés astúcia de mão.
sexta-feira, 13 de junho de 2014
Dicionário do Mofino 9/Jornalista desportivo, s.m. o transformista do jornalismo...
Jornalista desportivo, s.m. o transformista do jornalismo; espécie de publicista adepto do perspectivismo
de Nietzsche - não há factos, só interpretações; especialista em não
acontecimentos capaz de transformar a contusão de um perónio ou um fora-de-jogo
num portfólio; ruminante de estádio; criatura opiniosa e longividente capaz de
ver em cada facto o seu ponto de vista.
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