«Estamos a ficar mais
gordos. Na Austrália, nos Estados Unidos e em muitos outros países tornou-se
comum ver pessoas tão gordas que bamboleiam em vez de andar. O aumento da
obesidade é mais abrupto no mundo desenvolvido, mas está também a ocorrer nos
países pobres e de rendimento médio.
O
peso de uma pessoa só a ele ou a ela diz respeito? Devemos simplesmente
tornar-nos mais tolerantes quanto à diversidade de formas corporais? Não me
parece. A obesidade é um assunto ético, porque um aumento de peso em alguns
impõe custos nos outros.
Estou a escrever isto num aeroporto. Uma franzina mulher
asiática registou-se num voo com, calculo, cerca de 40 quilogramas (88 libras)
de malas e caixas. Ela vai pagar a mais por exceder o peso permitido. Um homem
que pese pelo menos 40 quilos a mais do que ela, mas cuja bagagem esteja dentro
do limite, não paga nada. E no entanto, em termos do consumo de combustível do
avião, não há diferença se o peso extra é relativo a bagagem ou a gordura
corporal.»
Peter Singer
A saúde já não é o mero silêncio dos órgãos. A sua maior virtude
e glória - o descaso íntimo de si própria, um corpo jovial – já não basta. A
saúde é um templo de mil zelos e desvelos em que os zelotas cuidam dos templos
próprios e alheios. A Organização Mundial de Saúde definiu-a como um estado
de completo bem-estar físico, mental e social, e não apenas a ausência de
doenças, definição que, se não descreve um estado de quase
beatitude, é todo um programa de Biopolítica e Bioética da Saúde.
Mas retornemos às questões de Singer: o peso de
uma pessoa só a ele ou a ela diz respeito? Devemos tornar-nos mais tolerantes quanto à
diversidade de formas corporais? As questões têm a clareza meridiana da
filosofia anglo-saxónica, mas o território problematológico no qual se
inscrevem – o corpo como lugar agónico da política - é território continental reconhecível. Em La Naissance de la Médicine Sociale (1974),
Foulcaut escrevia: «O controlo da sociedade sobre os indivíduos não
se efectua somente pela consciência ou o ideológico, mas também no corpo e pelo
corpo. Para a sociedade capitalista é o biopolítico que importava antes de
mais, a biologia, o somático, o corporal. O corpo é uma realidade biopolítica;
a medicina é uma estratégia biopolítica.»
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