terça-feira, 15 de março de 2016

“Todas estas viagens, toda esta coisa de Heathrow, é uma fuga colectiva da realidade. As pessoas vão até aos balcões do check-in e por uma vez nas suas vidas sabem para onde vão. Pobres bestas, está impresso nos bilhetes."

Recentemente, garantia-me um amigo ser isto o turismo: “hordas de bárbaros voam de continente para continente, de país para país, esbaforidos, sobraçando bagagens, à procura do lugar mítico do catálogo que transformou a viagem num trajecto de reconhecimento, sem lugar para o estranhamento e o inusitado”. E por causa disto, segundo ele, paulatinamente, um certo activismo anti-turismo tem feito o seu caminho crítico e mediático. A mim parece-me bem, mas o que dizer mais da pulsão turística que leva milhões de homens e mulheres a meterem-se em aviões e viajarem milhares de quilómetros, a maior parte deles com trajectos meticulosamente planeados e com destinos que terão de partilhar com outros milhares de estrangeiros, porque os locais, em boa verdade, já debandaram? O turismo, as grandes evasões bárbaras, parecem ser a nova crendice multicultural, como diz David Lodge, celebrado escritor inglês, no seu livro “Notícias do Paraíso”: “católicos, protestantes, hindus, muçulmanos, budistas, ateus - a única coisa que têm em comum é a crença inabalável na importância de ver o Parténon, a capela Sistina, a Torre Eiffel”. Ballard, no “Gente do Milénio”, dá uma explicação, digamos, mais existencial e niilista: “Todas estas viagens, toda esta coisa de Heathrow, é uma fuga colectiva da realidade. As pessoas vão até aos balcões do check-in e por uma vez nas suas vidas sabem para onde vão. Pobres bestas, está impresso nos bilhetes."

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