terça-feira, 28 de junho de 2011
Stephen Ball e os Terrores da Performatividade
A Mitologia subjectivou-se, e a heroicidade revela-se hoje num eu performativo inscrito nas diversas esferas da existência social. O culto do indivíduo sobreactivo, que forceja insanamente para maximizar todas as suas performances na profissão, na forma física, no sexo, no consumo, no envelhecimento (nas sociedades hipermodernas de horror à senescência, envelhecer é a performance por excelência) faz parte do sincretismo ideológico hodierno. Liptovesky já escreveu bastamente sobre a cultura da performance, da superação e da excelência - todos estimulados, todos determinados a ser competitivos, a correr riscos, a chegar ao topo –, mas foi Stephen Ball quem melhor descreveu os terrores da performatividade do moderno homo docens – o professor: relatórios atrás de relatórios, actas atrás de actas, justificações atrás de justificações, avaliações atrás de avaliações, evidências atrás de evidências.
segunda-feira, 27 de junho de 2011
Álvaro, Oxford e a Teoria dos Nomes Próprios
De visita a uma feira, Álvaro Santos Pereira, ministro da Economia, Emprego e Obras Públicas, reagiu ao tratamento protocolar de Senhor Ministro. Contou um episódio passado em Oxford, onde os professores se tratam por Bill e Eddie, afirmando querer ser tratado simplesmente por Álvaro. Marcelo Rebelo de Sousa não deixou passar a oportunidade para (com razão) ironizar: Imagino o motorista: Álvaro, vamos para o ministério ou bebemos um café?
Da Literatura
À Luz de uma certa filosofia da linguagem, os nomes são considerados designadores rígidos, isto é, a sua intensão é constante através da miríade de mundos possíveis, de modo que o Álvaro ministro da economia é também o Álvaro autor de um Diário de um Deus criacionista, e não deixa de ser por isso, ainda, o Álvaro oxoniano que tuteia os professores Bill e Eddie.
Ora, eu sempre tive uma reverência pia pela grave e excelsa Oxford e pelas vias apias pelas quais se lhe acede - Blood, Beauty and Brains - , mas eis senão quando, ex abrupto, uma noite insone e o Todas as Almas de Javier Marías me explicaram o desejo de informalidade do Álvaro e a tradição oxoniana do nome próprio.
A propósito da tradição das High Tables – uma espécie de symposium com maior variedade de alcoóis e na qual os fellows, nas noites mais formais, usam dinner jackets e academic gowns - , escreve Javier Marías:
No princípio são também muito formais, mas a sua longuíssima duração possibilita a aparição e desenvolvimento de uma grave deterioração dos modos, vocábulos, dicção, fluidez expositiva, compostura, sobriedade, atavios, comedimento e comportamento geral dos comensais, que costumam ser uns vinte.
terça-feira, 21 de junho de 2011
Ambrose Bierce, o Conservador, o Liberal e a Tomada de Posse: O Estranho Caso do Iliberal Programa de Emergência Social
segunda-feira, 20 de junho de 2011
quarta-feira, 15 de junho de 2011
A Crise Grega e a Farmácia de Platão
Se é verdade que a filosofia fala grego clássico, disse-o Heidegger , a economia começou a falar grego moderno ou, para sermos mais rigorosos, começou a gritá-lo nas praças e ruas de Atenas e de outras cidades gregas. O austeritarismo draconiano imposto pelo FMI e pela União Europeia assemelha-se, paulatinamente, a uma espécie de encarniçamento terapêutico que ameaça matar o paciente, contagiar os outros PIGS e impor a instante questão (a única questão a que importa responder, segundo alguns): o euro é para acabar ou reformar ?
Num texto canónico do maneirismo desconstrucionista - La Pharmacie de Platon -, Derrida traça as constelações semânticas da palavra pharmakon nos diálogos platónicos, e desse traço hermenêutico relevou os sentidos que Platão, hoje redivivo, aplicaria também ao Plano Grego e às políticas de austeridade prometidas pelo Governo do primeiro-ministro George Papandreou: pharmakon - remédio, veneno, a cura, a doença e a sua causa.
segunda-feira, 13 de junho de 2011
Leituras da Crise : Innerarity - Nervosismo e Invisibilidade
JUROS DA DÍVIDA PORTUGUESA BATEM NOVOS RECORDES
As incertezas sobre uma solução para a Grécia estão a deixar os investidores nervosos: os juros da dívida nacional dispararam para novos máximos.
Público
Quando, por exemplo, «os mercados» reagem com nervosismo, não há nenhum interlocutor que possamos tranquilizar ou criticar. Os próprios poderes são invisíveis e inimputáveis; no máximo, pode-se protestar nas conferências internacionais ou derrubar o World Trade Center, mas o sistema sai indemne, precisamente porque não consiste numa organização governamental de um centro visível. É a própria configuração do nosso mundo que torna praticamente tão difícil protestar como governar.
Daniel Innerarity
domingo, 12 de junho de 2011
Dicionário Do Mofino 35
Frugalidade, s.f. Virtude metabólica cuja natureza depende mais dos humores do corpo do que dos dons do espírito; na Carta a Meneceu, asseverou Epicuro que os alimentos frugais produzem um prazer idêntico ao de uma farta mesa, o que escandalizou a Teofagia cristã e levou Dante Alighieri, na Divina Comédia, a colocá-lo no Inferno como um herege; hábito manducatório entre o jejum e a glutoneria que até ao desmunido e falho de apetite crisma a virtude; se à intemperança em trânsito entre dois excessos convém a temperança, também à glutoneria entre duas indigestas comilanças apetece a frugalidade; outrora sageza e dietética da alma, almeja agora salvar o corpo e a Balança de Pagamentos.
sábado, 11 de junho de 2011
A Voz Ascética que Clama no Deserto
Comemorações do Dia de Portugal em Castelo Branco
Cavaco recomenda o exemplo de frugalidade e sacrifícios do interior
Público
Santo Agostinho, o Doutor Africano, rogava a Deus que o fizesse casto e, cônscio da fugacidade do tempo humano e dos seus ardores, acrescentava: "mas não já". Ora o professor Cavaco, invocando o instante Kairos econométrico, pretende jungir-nos à virtude da frugalidade que, sabemos bem, a par da castidade, é virtude assaz árdua e encosta arriba. Por aqui, glosando o confessional tom Agostiniano e imbuídos da proverbial humildade cristã, impetramos: "Senhor, fazei-me frugal, mas não já!"
Cavaco recomenda o exemplo de frugalidade e sacrifícios do interior
Público
Santo Agostinho, o Doutor Africano, rogava a Deus que o fizesse casto e, cônscio da fugacidade do tempo humano e dos seus ardores, acrescentava: "mas não já". Ora o professor Cavaco, invocando o instante Kairos econométrico, pretende jungir-nos à virtude da frugalidade que, sabemos bem, a par da castidade, é virtude assaz árdua e encosta arriba. Por aqui, glosando o confessional tom Agostiniano e imbuídos da proverbial humildade cristã, impetramos: "Senhor, fazei-me frugal, mas não já!"
sexta-feira, 10 de junho de 2011
A Maiêutica de Sócrates e a Ironia de Veríssimo
Sócrates vai viver para Paris e estudar filosofia
Um ano sabático no estrangeiro para se afastar do País é o projecto imediato do primeiro-ministro cessante, que perdeu as eleições domingo passado.
De acordo com a edição de hoje do jornal "Expresso", José Sócrates irá durante o próximo ano para Paris para estudar Filosofia devendo levar com ele o filho mais velho.
Num jantar no domingo passado, após a derrota nas eleições legislativas para o PSD, José Sócrates terá confidenciado esta intenção a algumas pessoas mais próximas.
Diário de Notícias
Conhece-te a ti mesmo, mas não fique íntimo.
Luís Fernando Veríssimo
sábado, 4 de junho de 2011
Como Mudar o Pessoal Político Usando o Comando da Televisão e Uma Citação de La Rochefoucauld
Por ser verdadeira a afirmação de Pascal Bruckner em La Mélancolie Démocratique de que mudamos de pessoal político como fazemos zapping na televisão, por fadiga das mesmas imagens, procure o seu comando, sopese-o, liberte-se do efeito delusório da dúzia de botões, cite subvocalmente La Rochefoucauld - há certos defeitos que, bem apresentados, brilham mais do que a própria virtude - e, invocando toda a corte celestial, carregue a esmo. Aparecerá o mesmo.
sexta-feira, 3 de junho de 2011
Literatura & Eleições
Agora que os aparelhos partidários se preparam para os delíquios e efusões pós-eleitorais, o que diz a literatura, essa grande particularizadora, sobre a generalizadora política, para usarmos a oposição antitética de Roth em Casei Com Uma Comunista?
Recentemente, o crítico literário António Guerreiro citava Bourdieu e o paradoxo da objectivação para denotar a atitude que consiste em olhar de fora, como um objecto, as pessoas, as coisas da vida, a vida intelectual, suscitando a revolta das pessoas assim objectivadas.
A descrição objectiva das peripécias peripatéticas de um candidato em campanha, pari passu, aparentemente neutra, pode ser um inventário cínico, cómico, com eficiência crítica considerável. A política e a encenação da gravitas dos seus líderes, a retórica alambicada, o jantarismo, o pathos patético do patego comicieiro, têm um potencial cómico que, quando objectivado e descrito, permite um distanciamento crítico não despiciendo. Poderíamos concitar aqui, como exemplo de objectivação literária desta ambiência política, uma figura como Fialho de Almeida, o Pontífice de Café, mas apraz-nos mais lembrar Agustina e a sua visão panóptica sobre o grande e o pequeno.
O país estava a funcionar sob a fresca maneira dos politocratas. Já não era uma arte confidencial, era um desempenho de palco, com maquilhagem, provas de alfaiate recomendado, cores conforme o conselho da televisão ...
(...) Desprezavam o aparelho partidário, sempre à beira do stress e que usa as sondagens como quem usa calmantes.
Agustina Bessa Luís
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