terça-feira, 29 de novembro de 2011
SeX Files - Sexo Pós-marital
A tradição judaico – cristã jungiu sexo e casamento tão estreitamente, que o primeiro era definido pelo segundo. Tínhamos então a sequente e agónica progressão erótica: sexo pré-marital, sexo marital, sexo extra-marital. Tropeçávamos no primeiro, quedávamo-nos no segundo, resvalávamos para o terceiro. Mas só no quarto, o pós-marital, descobríamos a sageza das palavras de Lord Chesterfield, escritas em missiva célebre endossada ao seu filho: «o prazer é momentâneo, a posição é ridícula, e o preço a pagar incomportável.»
segunda-feira, 28 de novembro de 2011
Diário dos Perplexos - Is This Really The End
O que fazer quando tudo arde? Aproximamo-nos cautamente de elemento menos abrasivo.
No Sábado passado, The Economist anunciava que "existem sinais de que a zona euro caminha para uma recessão, se é que já não estará nessa situação". Constatando o agravamento da situação económica e financeira, a revista britânica afirmava que "é agora mais provável uma calamidade ainda maior. A intensificação das pressões financeiras aumenta as probabilidades de um 'default' desordenado de um país, uma corrida aos depósitos dos bancos ou uma revolta contra a austeridade que marcaria o início do fim da zona euro". Hoje, a OCDE estimou um agravamento da economia portuguesa em 2012, “traçando um cenário ainda mais pessimista do que o Governo e a Comissão Europeia, com uma contração do PIB a rondar os 3,2% em 2012 e o desemprego a trepar aos 14%”. Hoje ainda, em Portugal, o primeiro-ministro, presente na Conferência Marítima da União Europeia para a Região Europeia, afirmou querer a Europa a crescer de olhos no mar.
O que fazer quando tudo arde? Talassoterapia?
domingo, 27 de novembro de 2011
Genealogia da Dívida
No número 54 da revista Philosophie, Alexandre Lacroix assina o artigo Comment l’ Occident a Inventé la Dette. HeIdeggerianamente, o autor defende que a essência da dívida económica não deve ser procurada na economia, e ensaia uma tentativa de radicação do discurso económico da dívida na própria estrutura moral e metafísica do Ocidente e nas suas concepções de humano, tempo, história, mediante três figuras tutelares da Filosofia da Cultura – Nietzsche, Freud, Benjamin.
Detenhamo-nos em Nietzsche que, na segunda dissertação da Genealogia da Moral, consagra uma longa passagem ao conceito de dívida-culpa (relembra Lacroix que, na língua alemã, a palavra Schuld significa dívida e culpa, e que a ligação entre as duas dimensões se faz espontaneamente). É pela dívida-culpa que o homem, ser de promessa, animal promitente, supera a sua condição animal e inscreve o tempo histórico e a memória na temporalidade animal. A promessa e a memória da promessa, como culpa ou ameaça de punição, são a genealogia da dívida, e Nietzsche elucida-nos sobre as primevas formas de recuperação das dívidas pelo credores, designadamente a manu militari, «em que o credor podia infligir ao corpo do devedor todos os tipos de humilhações e torturas, por exemplo cortar um pedaço que parecesse corresponder à dimensão da dívida…» Para além da dimensão moral, subjaz também ao conceito de dívida uma dimensão metafísica, teleológica, que remete para uma concepção linear de tempo e que, ascensional e melhorista (do pior para o melhor, da queda para a redenção), presume um providencialismo soteriológico no qual o acto de fé implícito no crédito nunca é um acto completamente irracional, podendo ser inscrito numa economia da salvação (aquele que empresta acredita vir a receber, aquele que pede acredita melhorar a sua situação e pagar).
Agora que o moralismo austeritário nos pôs a falar a língua da crise – culpa, e que o acto de crédito parece ter deixado de ser inscrito numa economia da salvação, resta-nos, também com Nietzsche, aprender o pessimismo.
quinta-feira, 24 de novembro de 2011
SeX Files - Provérbios do Mofino
O SexLab é um laboratório de investigação em sexualidade da universidade de Aveiro, exclusivamente dedicado à investigação experimental e psicofisiológica de diferentes aspectos da sexualidade humana, e que tem desenvolvido actividades várias de sexus mensura como a vasocongestão vaginal (fotopletismógrafo vaginal), que avaliam o nível de excitação fisiológica nas mulheres, as medidas de tumescência peniana (indium gallium gauge), que avaliam as mudanças na circunferência peniana e, mais recentemente, a concepção de escalas de medida de excitação perante a pornografia.
Recentemente, o SexLab concluiu que os homens têm tido respostas sexuais muito abaixo do que é habitual quando estão a ver filme pornográficos. As médias de excitação são próximas dos cinco (numa escala de dez), abaixo da média dos estudos de outros países europeus. Já as mulheres tiveram médias próximas ou superiores às médias europeias.
É pusilânime a fé do professo, mas o entusiasmo do converso é proverbial.
Recentemente, o SexLab concluiu que os homens têm tido respostas sexuais muito abaixo do que é habitual quando estão a ver filme pornográficos. As médias de excitação são próximas dos cinco (numa escala de dez), abaixo da média dos estudos de outros países europeus. Já as mulheres tiveram médias próximas ou superiores às médias europeias.
É pusilânime a fé do professo, mas o entusiasmo do converso é proverbial.
quarta-feira, 23 de novembro de 2011
Musicofilias/Paul Motian 1931 - 2011
Em 1976 Paul Motian, todos sabemos, dedicou-nos em co-autoria For A Free Portugal. Mas já antes tinha feito muito por todos nós. Continuou a fazer, e a herança , mais de 60 anos de inteligência e emoção musical, aí está.
segunda-feira, 21 de novembro de 2011
Dicionário Do Mofino 44
Casamento, s.m. Substantivo que designa simultaneamente um estado e uma passagem: como estado, é o estado civil mais parecido com o estado de sítio, como passagem, penosíssima, é sempre difícil lobrigar uma saída. Na primeira carta aos Coríntios, o apóstolo Paulo exortou: “Mas, se não podem conter-se, casem-se. Porque é melhor casar do que abrasar-se". Felizmente, alguns séculos de hermenêutica e exegese bíblica demonstraram que a injunção Paulina exprimia um desejo de aclimatação sazonal; depois de ler, em Platão, o que Sócrates alvitrou sobre o casamento - "Em todo o caso, casai-vos. Se vos couber em sorte uma boa esposa, sereis felizes; se vos calhar uma má, tornar-vos-eis filósofos, o que é excelente para os homens” –, compreendi que a filosofia não nasce do espanto, mas sim do daimon maligno da mulher rixosa, e que todos os homens casados são, espontaneamente, filósofos; Benjamin Disraeli , sapientíssimo, defendeu que todas as mulheres, contrariamente aos homens, deveriam casar, o que nos permite inferir que o matrimónio perfeito é aquele em que a mulher é casada, e o marido, prestadio, assiste o casamento da sua esposa.
sábado, 19 de novembro de 2011
SeX Files - a nudez oferecida pela boca
Um pouco à la Bataille, Pedro Mexia escreveu no Lei Seca: "Nenhuma religião pode ser verdadeiramente casta. Não é por acaso que «adorare» significa «levar à boca»". Ipsis verbis, George Bataille: "É evidente que o tratamento do erotismo em nada é exterior ao domínio da religião, mas precisamente o Cristianismo, opondo-se ao erotismo, condenou a maior parte das religiões. Neste sentido, a religião cristã é talvez a menos religiosa das religiões".
Adorare : “ad”, movimento “em direção a”; “orare”, de “os/oris”, “a boca”, “o rosto”, “a face”. Justamente, outra vez Bataille: a nudez oferecida pela boca e pela face, "o corpo abrindo-se à continuidade através desses comportamentos secretos que nos dão o sentimento de obscenidade".
sexta-feira, 18 de novembro de 2011
Dicionário Do Mofino 43
Contingente, s.m. filosoficamente, o que podia ter sido de outro modo, mais conveniente; na Teodiceia, Leibniz, que, tendo sido diplomata, sempre teve um subido sentido das conveniências, negou a contingência deste vale de lágrimas, advogando que Deus nada fez ao acaso e que estamos no melhor dos mundos possíveis - o que assentiríamos de bom grado, não fosse a gota e o Ministro das Finanças (embora alguns asseverem que Leibniz morreu de monadonucleose, na verdade morreu de gota). À Contingência opõe-se a Necessidade - o que não pode, de dicto e de re, ser ao meu modo -, que também me tem trazido muitos inconvenientes, designadamente o de, sendo casado, não poder ser solteiro.
quarta-feira, 16 de novembro de 2011
Leituras da Crise - Europa era filha do rei da Fenícia...
Na mitologia grega, Europa era filha do rei da Fenícia, Agenor, e irmã de Cadmo. Foi raptada por Zeus que se disfarçou de touro para que sua ciumenta mulher, Hera, não percebesse.
Na narrativa actual, verosímil, os europeus, acossados e cativos, perceberam que a política já não é a tentativa de civilizar o futuro. A autonomia do político, isto é, a potência de se dar e dar um nomos, uma lei, um futuro, foi capturada pela heteronomia do económico, pela privatização eudemonista da utopia, pela encenação figurativa no proscénio mediático.
Diz-nos Innerarity que, perante o poder do mediático e do financeiro, dos mercados e da judicialização, a política se encontra retraída e recalcada por estas lógicas que lhe reduzem o espaço, e que tendem a considerá-la uma actividade ociosamente conflitual e prescindível. Incapazes de civilizar colectiva e comummente o futuro pela política ou, pelos menos, de obstaculizar à sua barbarização regressiva ( da qual a erosão de direitos sociais primordiais é o exemplo), privatizámos a utopia e tendemos a conceber o espaço público como irrelevante em ordem à nossa felicidade, como mero garante do privado, não como ampliação do privado.
Mas as figuras do retorno da política estão aí: o seu retorno mecânico e nómico através do fortalecimento dos seus mecanismos e instituições – sob o signo do pêndulo; o regresso agónico e tenso – sob o signo do Indignez-vous!, do Enragez-vous!, do retorno do recalcado. Em qualquer dos casos, a política é o futuro da Europa, a sua esperança e garantia de liberdade.
segunda-feira, 14 de novembro de 2011
Diário dos Perplexos - Ambrose Bierce, Marx e a Teoria do Valor Trabalho
No Dicionário do Diabo, o bitter Bierce escreveu aquilo que o gentio já sabia per saecula seculorum: o trabalho é um dos processos através dos quais A cria riqueza para B. A definição é sinistramente marxista e remete para a teoria do sobretrabalho como exploração e alienação. Mas depois de ouvir o ministro Álvaro Pereira e o patrão da Confederação da Indústria Portuguesa a perorarem em uníssono sobre o aumento do horário de trabalho, depois de sopesar a panelinha e a carga fiscal imposta pelo sujeito C, o Estado, pensei: Ó dianho, Bierce! Afinal o trabalho é um dos processos através dos quais A cria a riqueza para B pagar as dívidas de C.
sexta-feira, 11 de novembro de 2011
Sexologia - Filosofia da Ciência
Popper dizia que a ciência era senso comum melhorado. Mas depois de lermos e ouvirmos os sexólogos, percebemos que o senso comum não é assim tão comum e as melhorias são sofríveis.
quinta-feira, 10 de novembro de 2011
Diário dos Perplexos - ein reich ein volk zwei euros
UNIÃO EUROPEIA
França e Alemanha negoceiam "Europa a duas velocidades"
por Lusa
Altos funcionários e especialistas dos Governos francês e alemão estão a estudar e a negociar com os parceiros do Benelux (Holanda, Bélgica e Luxemburgo) a criação de um "núcleo duro" dentro da UE, segundo o jornal El País.
Citando "fontes conhecedores das conversações", o jornal espanhol refere que se trata de uma estratégia que pode levar a alterações ao Tratado de Lisboa para formalizar uma "Europa a duas velocidades".
quarta-feira, 9 de novembro de 2011
SeX Files - Bestiário
Muito tem feito a Eufemística e a Literatura pelo bestiário sexual. Em 1534, Rabelais descrevia no Gargantua e Pantagruel o animal de duas costas - la beste à deux doz. No Othello, Iago, que deve ter lido o francês, avisa Brabantio que a sua filha and the Moor are now making the beast with two backs, e a nossa Agustina, epigonal, refere também seminaristicamente a refrega coital como o bicho de duas costas. Mas é Martin Amis, esse mitófago, que no London Fields cria o especimen tenebroso e mítico: o animal duplo com umas só costas.
Ele dormiu com ela uma vez e uma só vez: ela fez isso para Lhe mostrar o que fica a perder para toda a eternidade. Na cama, Nicola pô-lo a cometer o acto duplamente tenebroso: o animal duplo com umas só costas. Depois nunca mais.
Martin Amis – London Fields
segunda-feira, 7 de novembro de 2011
Musicofilias - Bad As Me
Sete anos depois de Real Gone, Bad as Me.
"Bad As Me"
You’re the head on the spear
You’re the nail on the cross
You’re the fly in my beer
You’re the key that got lost
You’re the letter from Jesus on the bathroom wall
You’re mother superior in only a bra
You’re the same kind of bad as me
...
domingo, 6 de novembro de 2011
Senhor, porque tens dado tão grandes sinais da tua inexistência?
Conta-se que Bertrand Russell, céptico contumaz, perguntado num colóquio sobre o que diria se, presuntivamente, depois de entregar a alma ao criador, o encontrasse, terá respondido: "Senhor, porque tens dado tão poucos sinais da tua existência?"
É comummente aceite que, malgrado as intermitências de conflitos e conluios, fé e razão, ciência e religião, não são magisteria sobreponíveis, reservando-se cada uma as singularidades irredutíveis que garantam a sua autonomia. Mas em bom rigor, com o dealbar da ciência moderna, a compreensão religiosa do mundo e do cosmos começou a habitar, acossadamente, uma pequena cidadela, sitiada de sorrate pela hiperpotência explicativa do discurso científico.
Michael Scriven advogou que "se falharem os argumentos a favor da existência de Deus, então a única posição racional não é simplesmente não acreditar em Deus; é o ateísmo, a crença de que não existe qualquer Deus". Alvin Plantiga, insurgiu-se contra o “imperialismo intelectual” desta posição, retorquindo que, mutatis mutandis, se falhassem os argumentos a favor da ideia de que Deus não existe, então supor-se-ia racional aceitar a sua existência. A solução avisada parecia ser quedarmo-nos numa estrita simetria probatória quanto à existência ou inexistência de Deus. Mas o Novo Ateísmo não está pelos ajustes. Se O encontrassem, Hitchens, Dawkins, Dennett, Harris, Stenger, perguntar-lhe-iam: Senhor, porque tens dado tão grandes sinais da tua inexistência?
quinta-feira, 3 de novembro de 2011
Diário dos Perplexos - A Democracia segue dentro de momentos ( a apatheia grega)
Grécia no século XXI
Um destes dias, Rui Bebiano do Terceira Noite citava a ominosa frase de Slavoj Žižek, dita em entrevista dada à Al-Jazeera em 29 de Outubro de 2011:
«O casamento entre o capitalismo e a democracia acabou. (…) Agora tudo está em aberto.» Hoje, referindo-se à possibilidade de M. Papandréou abandonar a ideia de referendo, titulava assim o Blasfémias um post: «Onde não há dinheiro não há vícios». E continuava: «Ou melhor dizendo, sem dinheiro, não há democracia directa que resista…» Há ideias que vão fazendo o seu caminho. Inicialmente, são flatus vocis, mas vão ganhando peso e efectividade. Conta-se que Carlyle, jantando com um homem de negócios que lhe invectivou o idear excessivo, terá respondido: «Houve uma vez um homem chamado Rousseau que escreveu um livro que não continha nada mais senão ideias. A segunda edição foi encadernada com a pele dos que se riram da primeira.»
Cautelas e caldos de galinha nunca fizeram mal a ninguém. Mas não é necessário Žižek profetizar desgraças. Elas estão aí.
Um destes dias, Rui Bebiano do Terceira Noite citava a ominosa frase de Slavoj Žižek, dita em entrevista dada à Al-Jazeera em 29 de Outubro de 2011:
«O casamento entre o capitalismo e a democracia acabou. (…) Agora tudo está em aberto.» Hoje, referindo-se à possibilidade de M. Papandréou abandonar a ideia de referendo, titulava assim o Blasfémias um post: «Onde não há dinheiro não há vícios». E continuava: «Ou melhor dizendo, sem dinheiro, não há democracia directa que resista…» Há ideias que vão fazendo o seu caminho. Inicialmente, são flatus vocis, mas vão ganhando peso e efectividade. Conta-se que Carlyle, jantando com um homem de negócios que lhe invectivou o idear excessivo, terá respondido: «Houve uma vez um homem chamado Rousseau que escreveu um livro que não continha nada mais senão ideias. A segunda edição foi encadernada com a pele dos que se riram da primeira.»
Cautelas e caldos de galinha nunca fizeram mal a ninguém. Mas não é necessário Žižek profetizar desgraças. Elas estão aí.
SeX Files - Parler d`amour, c`est faire l`amour
Balzac escreveu no Physiologie du Mariage que parler d`amour, c`est faire l`amour, como se o poder evocativo da linguagem fizesse disparar os neurónios da zona ventrotegmental e uma onda de dopamina nos encharcasse de prazer. Entender-se-iam assim as reservas docentes e discentes à Educação Sexual, compreender-se-ia então o rubor que enrubesce os seus titubeantes lugares retóricos, os seus circunlóquios e enrodilhamentos preliminares, a sua autovigilância e sisudez, os seus interditos e entreditos. O desafio da Educação Sexual nas escolas seria portanto este: como falar de sexo sem falar de sexo.
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